Era fácil observar a estante do local em que ela se encontrava. Era um local privilegiado, bem rente aquela enorma janela de estilo colonial que recepcionava a entrada maestral dos primeiros raios da alvorada. E já não bastasse a belíssima janela, havia aquela aconchegante poltrona reclinável com estampa de flores miúdas do campo e coberta por uma manta de retalhos de tricô festivos.
Era ali,bem dali que ela poderia ver a estante.Estante esta que havia sido delicadamente organizada: livros de um lado,revistas de outro, fotos em cima, caixas de cartas embaixo, livros ordenados por estilos,ordem alfabética ou degradê de cores. Porém,em uma brincadeira infantil, a estante se tremeu, balançou e nem as mãos ágeis da menina da poltrona conseguiram segurá-la.
Era tarde demais,a estante estava no chão.Percebendo a grande bagunça, a garota soltou um leve e demorado suspiro e passou a ater o seu tempo em (re)organizar aquela velha estante de madeira de carvalho. Foi nessa arrumação que ela percebeu que algumas coisas que estavam naquela estante já não faziam mais o menor sentido em estar ali, era apenas "perca de espaço,tempo e paciência".
Ela passou então a colher aquilo que ela não mais utilizaria, aquilo que ela já havia se desapegado, porém ainda estava ali. Em um grande caixa de papelão ela juntou livros de velhos romances, cds de falsas verdades, fotos de momentos não relevantes, cartas com destino a tristeza, papéis decorados de pessoas irrelevantes. Foi com rapidez que aquela se encheu e com mais rapidez ainda que a garotinha antes bem alojada em sua poltrona correu até o seu quintal e jogou aquela caixão de papelão fora, bem fora; fora de sua casa, de sua estante e deseja que saia de sua memória. Ao voltar para sua sala, a garotinha percebeu a sua estante reorganizada, com conotações e cores diferentes e muito mais espaçosa. Espaços estes que serão preenchidos por novos livros, cds, fotos, cartas e papéis que farão essa garota mudar um pouco mais a sua visão da poltrona, essa visão da estante, essa visão dessa estante quase viva."
M.
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